Execução Judicial de Criptomoedas
A execução judicial mostra-se como a forma efetiva de satisfação das demandas levadas até o judiciário, portanto, viabilizando concretamente que aquele que teve seus pedidos condenatórios julgados procedentes na etapa de conhecimento ou títulos extrajudicial receba os valores/bens por meio da coação do Estado-Juiz. Expedida a sentença que condena determinada pessoa ao pagamento ou entrega de bens ou mesmo existindo um título extrajudicial válido, havendo resistência ao cumprimento espontâneo, torna-se necessário buscar o judiciário para executar a sentença e, assim, restringir os valores ou bens necessários à satisfação do débito.
Usualmente a execução de valores ocorre sob a forma de bloqueios judiciais feitos sobre contas bancárias, carteiras de investimento ou mesmo por meio de penhoras sobre dinheiro físico ou bens. Portanto, havendo um título que justifique a execução, pode o magistrado lançar ordens para que os valores devidos sejam bloqueados juntos às contas bancárias do executado, permitindo que o valor seja direcionado ao exequente.
A questão que surge para a discussão é como se dá a execução judicial de criptomoedas, ativos tipicamente divergentes da realidade monetária vigente, pautando-se na desnecessidade de agentes intermediários, como bancos e entidades centrais, para circular e formalizar transações. As criptomoedas, com especial atenção ao Bitcoin, pautam sua circulação em mecanismos de criptografia capazes de gerar uma robusta privacidade aos usuários, de forma que se torna difícil identificar as partes fazendo transações em criptomoedas ou os possuidores desses ativos quando estão depositados em carteiras privadas. Assim, é de extrema dificuldade para os Estados identificarem os usuários desses ativos (quando fora de casas de câmbio) e imporem ordens de restrição sobre esses ativos.
As criptomoedas possuem valor econômico e, assim, tornam-se reservas de valores acessíveis para uma parcela robusta da população. Diante disso surge a dúvida quanto à capacidade dos magistrados imporem ordens restritivas sobre esses ativos, especificamente penhoras judiciais em procedimentos de execução.
Em um primeiro momento, falamos na possibilidade jurídica das criptomoedas sofrerem restrições judiciais, como o caso da penhora judicial, haja vista seu valor econômico e, além disso, sua natureza enquanto bens imateriais, portanto, sujeitos aos direitos reais. Portanto, fala-se na possibilidade jurídica da constrição de criptomoedas.
Partindo para a sua efetiva execução, encontramos entraves robustos junto às atuais formas de execução válidas junto ao poder judiciário. Inicialmente, falamos na dificuldade dos exequentes comprovarem a existência de criptomoedas em contas privadas ou carteiras de acesso restrito, situação que já foi apreciada pelo Tribunal de Justiça de SP e levou ao indeferimento do pedido de penhora (AI nº2202157-35.2017.8.26.0000, 36ª Cam. Dir. Privado, Rel. Des. Milton Paulo de Carvalho Filho, j. 21/11/2017). Assim, falamos inicialmente da dificuldade da execução apontar com clareza a existência de criptomoedas sob o patrimônio do executado, situação que impede, juridicamente, o prosseguimento da execução.
Cumpre citar que a existência de criptomoedas em contas junto a casas de câmbio especializadas sinalizam uma maior possibilidade de eficácia da penhora judicial, visto que as casas de câmbio são pessoas jurídicas sujeitas ao exercício do poder jurisdicional, de forma que é possível correlacionar os clientes com os criptoativos ali depositados. Assim, por meio de casas de câmbio é possível correlacionar a existência de criptomoedas com o patrimônio do executado, situação que permite a penhora e já vem sendo adotada no poder judiciário.
No entanto, quando falamos no deslocamento de criptoativos de contas em casas de câmbio para contas privadas ou carteiras físicas, encontramos dificuldades expressivas para formalizar a penhora judicial. Ausente uma entidade central sobre a qual possa ser depositada uma ordem judicial de constrição, além de uma robusta criptografia, não há como efetivar uma restrição de criptoativos. Fora dos limites das casas de câmbio, portanto, dentro das bases natais do Bitcoin e seus protocolos, há a dependência de uma composição de chaves para que seja possível efetivar uma transferência de criptoativos, dependendo de uma chave pública, acessível por todos, e de uma chave privada, exclusivamente conhecida pelo seu possuidor.
Assim, não há qualquer entidade que possa forçar uma transferência de Bitcoins localizados em uma carteira privada, sendo uma operação dependente da simples vontade do seu possuidor em incluir sua senha particular. Portanto, não há procedimentos jurisdicionais capazes de viabilizar tal ordem de constrição, de forma que foge totalmente da capacidade do magistrado impor ordens de tamanha abstração e, além disso, impossíveis de efetivar a restrição dos valores.
Portanto, concluindo, falamos na incapacidade processual do direito impor ordens restritivas sobre patrimônio imobilizado em criptomoedas depositadas em carteiras ou contas privadas. Por sua vez, estando as criptomoedas sob a custódia de uma casa de câmbio, locais onde ocorrem as negociações desses ativos, fala-se sim na possibilidade de contrição, mediante a expedição de ordens veiculadas a tais entidades, que são pessoas jurídicas e são sujeitas ao exercício da coação estatal.
Este texto é uma contribuição do jurista Gustavo Alarcon Rodrigues ao blog Direito de Saber. O que você achou do texto? Deixe sua opinião nos comentários, ela é muito importante para nós!
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