Projeto de Lei 3.683/89 – O Lado Oculto do Código de Defesa do Consumidor Parte 1
Muito se fala na Defesa do Consumidor, mas poucos conhecem o lado oculto do Código de Defesa do Consumidor – o lado afastado pelos lobbys (e algumas partes dele, pelo bom senso). O texto de hoje faz parte de uma série que visa trazer ao leitor alguns dos temas que foram vetados do Código de Defesa do Consumidor e uma análise do por quê isso é benéfico ou não para o consumidor e a Ordem Econômica como um todo.
Primeiramente, cabe fazermos uma análise à luz da época que o país viva em 1989 – sem computadores, internet ou smartphones. Grandes marcas varejistas eram exclusividade das capitais e outras grandes cidades, a maior parte do comércio praticado por lojistas locais.
Art. 6, IX do Projeto – Previa a participação dos consumidores diretamente e a consulta dos mesmos para elaboração de políticas que os afetassem; além de conferir sua representação a entidades de Defesa do Consumidor.
Esse artigo ter sido vetado significa retirar a voz do consumidor sobre aquilo que lhe afeta. Quantos de nós nunca nos sentimos enganados pelos fast-foods com suas “Imagens meramente ilustrativas”? Ora, se a pessoa não consegue vender aquele produto, por quê então é permitido veicular propaganda como se assim o fosse? Retirar a voz do consumidor significa que ele perde a capacidade de dizer o que lhe afeta e incomoda, e fica sujeito apenas ao que o Estado determina que é bom para ele, sem poder sequer levantar voz contra abusividades estabelecidas, como a das “Imagens meramente ilustrativas”.
Hoje sites como “Reclameaqui”, do Procon e o Facebook permitem um engajamento maior do consumidor diretamente com os fornecedores, coisa que não era realidade na época. De fato era inviável a participação popular em uma época que o telefone ainda era artigo de luxo para alguns lares no Brasil, mas retirar a possibilidade não se figura solução para o problema. Se vivemos em uma democracia representativa em que elegemos nossos líderes, também as associações de Defesa do Consumidor deveriam poder eleger alguém que falasse diretamente sobre as demandas do consumidor.
O próximo artigo a ser analisado é o art.11, que enuncia que os produtos que mesmo utilizados ou fruídos de maneira adequada, apresentarem alto grau de nocividade ou periculosidade, deveriam ser retirados do mercado sem prejuízo de eventuais indenizações.
Isso é uma situação mista. A solução do legislador é sempre remover aquilo com o que não consegue (ou não quer) lidar. Tal ocorre porque há situações que os produtos, mesmo se enquadrando nessa hipótese, são necessários para o fiel funcionamento da sociedade.
Tome-se por exemplo um hospital que adquirisse máquina de Raio-X e a utilizasse normalmente na produção de exames dos pacientes. O hospital, ao adquirir a máquina, se torna consumidor de acordo com a definição do Código de Defesa do Consumidor, pois adquiriu como Pessoa Jurídica o produto como destinatário final. A máquina em si emite radiação, razão pela qual os encarregados delas possuem aposentadoria especial por conta da exposição ao risco. O produto, a máquina de Raio-X, está sendo utilizada de maneira adequada, mas ainda assim possui grau de nocividade – reconhecido pela necessidade de aposentadoria especial; deveria ser a máquina de Raio-X deixar de ser comercializada por essa razão?
Obviamente se trata de uma exceção e não de uma regra; porém é necessário, ao editar uma lei de abrangência nacional, atentar-se às possibilidades e preverem o máximo possível, e não se limitarem a ausentar-se de legislar a respeito, criando lacunas.
Não seria, por exemplo, o caso de uma criança que ingerisse veneno para insetos. Nesse caso, não seria o uso adequado do produto, antes é uma irresponsabilidade dos pais e responsáveis por deixar produto que sabem ser nocivo ao alcance de criança.
Esse artigo exige por si só uma análise extensa e detalhada. É de se imaginar que o veto servisse para dar mais tempo de discutir a questão, porém não é o que se observa na prática ao ver que o veto foi mantido sem uma análise crítica sobre o grau de nocividade que pode ser tolerado e em quais atividades, elucidando as razões para tal, com a respectiva informação ao consumidor. Produtos nocivos de fato devem ser retirados do mercado, porém, há exceções e ao invés de regulamentá-las, preferiu o legislador remover inteiramente a disposição.
Com isso chegamos ao final da primeira parte da análise dos vetos ao Código de Defesa do Consumidor na nossa série que visa elucidar o que ficou de fora do Código e por quê. O que você achou do texto? Tem dúvidas, sugestões ou comentários? Deixe nos comentários, sua opinião é importante para nós!
O projeto de Lei 3.683/89 pode ser visualizado através do seguinte link:
http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD21SET1989.pdf#page=125; Acesso em 22/01/2021.
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